A Odontologia Digital na rotina do consultório
Agregar a Odontologia digital à rotina de consultórios e clínicas tem se tornado positivo para conferir maior versatilidade, rapidez e precisão aos atendimentos. Com a pandemia do novo coronavírus e a consequente necessidade de redução no fluxo de agenda, as tecnologias também permitem que a(o) cirurgiã(o)-dentista concentre os procedimentos em uma única visita do paciente, a fim de evitar deslocamentos constantes e a maior exposição à doença.
O primeiro passo para entender a Odontologia digital é saber que os benefícios vão além da área de prótese bucal. Comumente associados ao modelo de software CAD/CAM, em que o molde é criado em tempo recorde a partir do escaneamento digital da arcada dentária, os recursos tecnológicos na área odontológica são utilizados em todas as etapas do atendimento.
“A tecnologia está presente desde o início e em várias fases do tratamento, como na primeira consulta, ao permitir determinar o real problema bucal e orientar diagnóstico e prognóstico”, comenta o professor associado do Instituto de Ciência e Tecnologia da UNESP (ICT-UNESP) e vice-presidente da Sociedade Brasileira de Odontologia Digital, Guilherme Saavedra.
É o que reitera o professor associado da Faculdade de Odontologia da Universidade de São Paulo (FOUSP), Carlos Francci, que explica como algumas ferramentas podem facilitar a rotina ao eliminar demandas das(os) cirurgiãs(ões)-dentistas. “Temos o micro motor elétrico, opção ao motor convencional que, em geral, muitos pacientes têm pavor. Controlado por computador, é possível ajustar a velocidade para uma remoção de cárie e para um preparo de prótese. Existe a radiografia feita com recursos digitais, em que se ganha menor exposição do paciente à radiação, velocidade de procedimento e não polui o meio ambiente. E a anestesia por computador, por meio da qual o fluxo do anestésico é controlado por uma central e não depende da(o) cirurgiã(o)-dentista, o que reduz a chance de dor.”
Quando o assunto são as próteses e procedimentos estéticos, Francci explica que os avanços conferidos pela Odontologia digital podem beneficiar desde modelos mais simples até estruturas completas. “No fluxo digital, podemos produzir desde incrustações e restaurações até próteses dentárias totais. Conseguimos fazer trabalhos parciais em um dente e reconstruções na boca toda, seja em cima de dentes preparados ou em cima de implantes. Do ponto de vista de usabilidade é excelente, porque você consegue executar diversos procedimentos”, comenta.
Segundo Guilherme Saavedra, a principal vantagem das tecnologias é diminuir as etapas dos processos, o que torna o atendimento mais simples e preciso. Por exemplo, na obtenção dos modelos tradicionais com gesso, é mais difícil captar os detalhes para a produção da prótese do que por meio do escaneamento digital, além de o processo causar desconforto para muitos pacientes.
“Os fundamentos biológicos da Odontologia não mudaram, porém conseguimos usar ferramentas para simplificar os processos e, com isso, diminuir o número de etapas e também a margem de erro”, explica.
Em geral, os principais recursos tecnológicos disponíveis atualmente são: os scanners, que permitem a captura de informações e delineamento de estruturas anatômicas, garantindo mais confiabilidade do que a moldagem convencional; os softwares de captura de imagem, que possibilitam desenhar a restauração, o planejamento de implantes e o alinhamento dental; as impressoras (método aditivo) e as fresadoras (método subtrativo), responsáveis pela obtenção de objetos tridimensionais a partir de tecnologias opostas, sendo as primeiras por adição de material e as segundas por subtração.
Modelos de aquisição e mão de obra
Se optarem por aderir ao fluxo digital, as(os) cirurgiãs(ões)-dentistas têm à disposição algumas ferramentas para incorporarem aos consultórios. É necessário entender qual a real demanda e investir de forma correta, para evitar tecnologias que não se agreguem às especialidades.
“A compra deve ser baseada no modelo de negócio da(o) profissional e precisa ser muito bem avaliada, porque sofre obsolescência e os materiais precisam de manutenção e atualização”, comenta Guilherme Saavedra.
Também é importante salientar que a clínica ou consultório pode terceirizar os serviços ou alugar as ferramentas. Além disso, é preciso ter em mente que a Odontologia digital precisa de mão de obra qualificada para o controle das máquinas.
De maneira geral, as(os) cirurgiãs(ões)-dentistas encontram três formas mais comuns de aderir à Odontologia digital: terceirização, locação e o chairside. Na primeira, é possível contratar os serviços de um laboratório que use recursos digitais. É o caso de, por exemplo, solicitar tomografia com imagens computadorizadas ou um planning center (centro de planejamento cirúrgico).
Já na segunda opção, a(o) profissional pode locar os equipamentos para utilizá-los na clínica ou no próprio laboratório fornecedor. O modelo chairside corresponde à inserção completa do fluxo digital, o que requer conhecimento técnico e capacidade para suportar a estrutura na unidade.
No chairside, é imprescindível que a(o) cirurgiã(o)-dentista domine as tecnologias - por cursos de capacitação, normalmente focados em cada dispositivo - ou contrate mão de obra especializada para o controle das ferramentas. “Um ambiente em que exista a(o) cirurgiã(o)-dentista e a(o) técnica(o) com capacidade para trabalhos digitais, como a(o) cadista, é o cenário considerado mais promissor.
A(o) cirurgiã(o)-dentista trabalha todo o preparo de boca e o escaneamento, enquanto a(o) técnica(o) confere o sistema computacional, verifica se a imagem está bem capturada e depois faz o desenho e a preparação da peça. Logo, é preparada a construção da prótese, que é avaliada na boca do paciente, para verificar cor e, assim, a(o) cadista faz a maquiagem para chegar esteticamente em algo natural”, explica Carlos Francci.
Mesmo que inseridas de forma terceirizada, as vantagens da Odontologia digital englobam conforto e segurança, maior monitoramento da(o) cirurgiã(o)- dentista durante os processos, tempo de exclusividade para cada atendimento e imediatismo em encontrar soluções para os pacientes. Segundo Francci, esses pontos ajudam a construir um “valor agregado” de custo-benefício às tecnologias, frente ao investimento financeiro necessário para adquiri-las.
Novo normal?
Segundo os especialistas, os novos modelos de atendimento impostos pela pandemia da Covid-19 podem ajudar na expansão da Odontologia digital. Isso porque as ferramentas tecnológicas facilitam os protocolos de biossegurança, junto à necessidade de redução do fluxo de agenda, padrões que provavelmente não serão abandonados no pós-pandemia.
“No momento atual, em que existe a necessidade de diminuir o fluxo de pacientes, a Odontologia digital é um contraponto interessante para atender menos pessoas em uma sessão única, ao facilitar a realização de diversos procedimentos”, afirma Guilherme Saavedra. “Outra vantagem é o escaneamento intraoral comparado ao molde, pois evita o contato com saliva e sangue, além de trazer mais segurança para a(o) profissional e conforto para o paciente”, completa.
No entanto, a(o) cirurgiã(o)-dentista Guilherme Saavedra acredita que a expansão pode esbarrar em entraves como a alta do dólar e a falta de fomento nacional, o que tornam as ferramentas disponíveis apenas para uma parcela restrita de consultórios.
“O Brasil é fonte de qualificadas(os) profissionais e ideias. Com o câmbio desfavorável, acredito que a aquisição de novos materiais será postergada. Seria interessante se tivéssemos como fomentar isso, para elevar o nível da nossa profissão e dar condições melhores para as(os) profissionais e para os pacientes que receberão o tratamento.”
De acordo com Saavedra, a tecnologia agregada à atuação da(o) cirurgiã(o)-dentista tem um papel fundamental para a resolução de problemas e democratização dos resultados obtidos. “O fluxo digital tem um poder muito interessante no planejamento, na integração de diversas especialidades, na captura e uniformização das informações. E tem um fator que possibilita a democratização dos resultados operacionais e também de custo”, afirma