Proteja o patrimônio pessoal das dívidas da empresa

Gestão Por Conexão Dentista - 12/12/22

Em artigo para o Portal Endeavor, o advogado Renato Giovanini Filho comenta alguns mecanismos legais que protegem o patrimônio pessoal do empresário de dificuldades econômicas empresa. Veja abaixo:

Medidas legais de proteção do patrimônio pessoal

Bem de família

A maioria das pessoas já ouviu falar que sua residência é considerada bem de família. Esse instituto jurídico faz do imóvel residencial impenhorável por credores. O que nem todo o mundo sabe, contudo, é que é possível averbar na matrícula do imóvel que ele consiste em um bem de família. A averbação faz com que o próprio cartório de Registro de Imóveis impeça a penhora judicial do imóvel por credores.

Sem ela, a penhora é realizada, e o proprietário deverá levantá-la no curso do processo judicial (em que foi realizada), mediante a apresentação de provas de que se trata de bem de família. Essa averbação pode ter um custo um pouco mais elevado do que o esperado, principalmente nos grandes centros urbanos, mas, tratando-se da tranquilidade de o empreendedor manter a própria casa, pode ser que valha a pena, especialmente se os planos forem de residir no imóvel por um longo período de tempo.

Doações com cláusulas de incomunicabilidade, impenhorabilidade e inalienabilidade

Uma medida mais ampla é a doação de bens gravada com as cláusulas restritivas, isto é, incomunicabilidade, impenhorabilidade e inalienabilidade. O empreendedor que sabe que tem um risco elevado de perder seu patrimônio pessoal para os credores da sua empresa pode doá-lo para terceiros, especialmente seus herdeiros, antecipando a sua sucessão. Mesmo com as precauções citadas acima (ausência de subcapitalização da empresa, de confusão patrimonial e de mau uso da personalidade jurídica), o empreendedor normalmente “sabe” se corre o risco real de perder o seu patrimônio pessoal para as dívidas da sua empresa. Nessa situação, a doação com as cláusulas restritivas pode ser a medida adequada (lembrando-se que, em caso de quebra, o investimento feito pelo empreendedor irá se perder).

A incomunicabilidade é a cláusula pela qual o bem doado fica impedido de ser transferido no futuro para o cônjuge do donatário (quem recebe a doação). O objetivo é que o bem fique na família do doador. A impenhorabilidade é a cláusula pela qual o bem doado fica a salvo de penhora por parte de eventuais credores do donatário.

Muito embora, seguindo a mesma tendência da jurisprudência da pessoa jurídica, os juízes e tribunais brasileiros vêm decidindo pela sua ineficácia em relação aos créditos privilegiados (contra o donatário, e não o doador). E a inalienabilidade é a cláusula pela qual o bem doado não pode ser vendido. Geralmente limitada a um certo período de tempo, como, por exemplo, o tempo de vida do doador, é muitas vezes adotada como um reforço da impenhorabilidade contra os citados créditos privilegiados, uma vez que a jurisprudência reconhece que um bem inalienável não pode ser penhorado.

Contudo, a doação não pode ser feita em fraude contra credores, ou seja, quando o doador já tem uma dívida em seu nome. De modo contrário, o credor poderá ingressar com uma ação judicial denominada pauliana, com o objetivo de obter a anulação da doação e reaver o bem no patrimônio do donatário. O prazo decadencial da ação pauliana é de 4 anos, a contar da doação.

E a doação também não pode ser feita em fraude à execução, isto é, quando o doador tem contra si processo judicial. Se feita em fraude à execução, o juiz poderá considerar a doação ineficaz em relação ao credor e penhorar o bem no patrimônio do donatário. Diferentemente da fraude contra credores, a fraude à execução não está sujeita a prazo decadencial, podendo o juiz reconhecê-la a qualquer momento no processo. E ela pode inclusive trazer consequências penais para o doador.

Doações para entidades fiduciárias no exterior

Alternativamente à doação de bens a herdeiros, o empreendedor pode fazer uso de entidades legais fiduciárias no exterior, como trusts e fundações privadas. Geralmente destinados a gerenciar recursos financeiros em favor de seus beneficiários, as entidades fiduciárias costumam ser uma alternativa adequada quando a doação para pessoas naturais não for desejável por qualquer motivo ou que se trate de recursos financeiros que devam ser mantidos sob gestão profissional de um banco ou gestora de investimentos independente.

Essa é naturalmente uma alternativa que faz sentido para empreendedores que têm bens no exterior e não têm dificuldades em administrar essas entidades legais no dia a dia.

As mesmas observações feitas em relação à fraude contra credores e à fraude à execução acima aplicam-se às doações para as entidades fiduciárias estrangeiras, além da ressalva de que o empreendedor deve cumprir todas as obrigações fiscais e cambiais correspondentes.

Outros bens impenhoráveis

O empreendedor pode ainda fazer uso dos planos de previdência privada. Os recursos mantidos nesses planos podem não trazer altas rentabilidades financeiras, mas gozam de impenhorabilidade, que vem sendo confirmada pelo Superior Tribunal de Justiça – STJ, além de não precisarem ser partilhados por meio de inventário no caso de falecimento do seu titular. É comum assim que sirvam como uma reserva do empreendedor para a situação de quebra, servindo também para que os seus dependentes façam frente a despesas após o seu falecimento.

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