Síndrome de Burnout em Odontologia

Gestão Por Conexão Dentista - 12/12/22

Em estudo de 2016 da Isma-BR (International Stress Management Association), feito entre mil profissionais de Porto Alegre (RS) e São Paulo (SP), com idade entre 25 e 65 anos, constatou que 72% dos entrevistados estavam frequentemente estressados. Desses, 32% apresentavam sintomas de Burnout. Já uma pesquisa no serviço público de Araraquara revelou que 48,3% das(os) cirurgiãs(ões)-dentistas do município sofriam com a condição em 2010, segundo a Revista de Odontologia da UNESP.

Em 2019, a Organização Mundial da Saúde (OMS) incluiu a síndrome de Burnout na próxima edição da Classificação Internacional de Doenças (CID-11), que vigora a partir de 2022. A condição não foi listada como uma doença, mas como um “fenômeno” relacionado ao trabalho que afeta a saúde. Foi inserida no capítulo de “problemas associados” ao emprego ou ao desemprego, como sendo “uma síndrome resultante de um estresse crônico no trabalho que não foi administrado com êxito”.

A crise econômica e as demissões decorrentes (possivelmente também por conta da pandemia do coronavírus) aumentam a pressão sobre as pessoas que estão desempregadas e resulta estresse duradouro, ansiedade e depressão, o que favorecem a ocorrência da síndrome. Portanto, é importante buscar ajuda profissional nessas situações, pois a saúde mental é essencial para manter o foco na procura de recolocação no mercado de trabalho.

Segundo o psicólogo Luiz Francisco Júnior, membro da Comissão Gestora Metropolitana do Conselho Regional de Psicologia de São Paulo (CRP-SP), os sintomas dessa síndrome aparecem isolada ou simultaneamente, por meio de dores físicas, mudanças comportamentais e aspectos psíquicos. Manifestam-se em quadros crônicos de adoecimento fisiológico, como enxaquecas, gastrites, dores na coluna, náusea, tensão muscular, entre outros, que são decorrentes da sobrecarga hormonal inerente ao estresse.

Há também a mudança no funcionamento do organismo, alterando a qualidade da imunidade, do sono e dos processos cognitivos: a percepção, a atenção, o pensamento e a memória começam a apresentar um funcionamento qualitativamente menor se comparados a momentos de vida saudável dos indivíduos. Somam-se a esses possíveis sinais de alerta, as atitudes desproporcionais como insônia, impaciência, irritabilidade, choro ou agressividade excessiva diante de situações cotidianas, antes encaradas com tranquilidade em condições de resiliência.

Portanto, trata-se de um processo de adoecimento decorrente de uma série de elementos do cenário laboral, como a própria organização do trabalho, a estrutura física e as relações construídas naquele ambiente, especialmente em atividades de intensa exigência por parte de clientes para intervenções que exigem criatividade e resolução de problemas. “Em outras palavras, pode-se dizer que é uma exaustão emocional, fruto da interação entre as características organizacionais e pessoais de quem por ela é acometido”, explica o especialista.

De acordo com Luiz Francisco Júnior, o crescimento da prevalência da doença pode se dar em função do sistema produtivo adotado pela cultura em que estamos inseridos, pois há uma valorização de aspectos quantitativos, ou seja, uma predominância do olhar para os resultados, sem pensar em aspectos qualitativos voltados para o bem-estar do indivíduo que trabalha, bem como para o sentido do trabalho em si.

O que leva à síndrome de Burnout

O psicólogo esclarece que o adoecimento se instala quando há “predominância de um descompasso entre as demandas e os recursos laborais”, especialmente com excesso de atividades, compromissos e dedicação ao trabalho. Isso pode levar à sobrecarga e, em seguida, à exaustão emocional. Em outras palavras, o desenvolvimento do estresse ocupacional vai acontecendo de modo gradual e se instalando na vida dos trabalhadores que, sem se dar conta, vão aumentando sua permanência ou carga horária, assumindo diversos compromissos em um curto espaço de tempo e descuidando das relações pessoais e profissionais, sob a justificativa de que precisam se dedicar à sua atividade técnica e especializada. Depois de certo tempo de recorrência, isso causa um quadro de esgotamento.

“Alguns autores descrevem estágios da síndrome que passam por uma exaustão emocional, que engloba sentimentos de dano emocional e carência afetiva, podendo passar pela despersonalização”, conta Luiz Francisco Júnior. Nesses casos, são constatadas respostas negativas, insensibilidade ou distanciamento considerável da população atendida em suas atividades profissionais. “Esses episódios podem colocar os pacientes, por exemplo, em uma condição de objeto, chegando a culminar na diminuição considerável do envolvimento pessoal no trabalho, o qual contempla os sentimentos de queda nas competências e no sucesso da trajetória profissional, associado a uma ideia de infelicidade e insatisfação”, alerta.

Por isso, ressalta-se a importância a autoavaliação e o autoconhecimento, pois, de modo geral, é uma condição que se inicia com sintomas leves e esporádicos, mas que, aos poucos, com o passar do tempo, vai aumentando a frequência, e, consequentemente, a gravidade e o comprometimento. O tratamento se inicia com a percepção de que o indivíduo precisa de ajuda especializada de profissional da saúde mental, psicologia ou psiquiatria, para avaliação do seu quadro e diagnóstico.

Cabe ao indivíduo acometido pela síndrome, em diálogo com os profissionais que o acompanharão, definir a melhor estratégia de intervenção. Isso porque, dependendo do quadro, pode ser necessária uma intervenção medicamentosa. Entretanto, sugere-se também a intervenção psicoterápica, uma vez que, para alteração das condições geradoras desse tipo de estresse, é necessário rever atitudes relacionadas às escolhas feitas para a condução do cotidiano ocupacional. “A reflexão sobre os aspectos psicológicos pode levar o sujeito, de modo processual, a alcançar espaços ou momentos para o compartilhamento de sentimentos, além do investimento em rotinas, cargas horárias e regime de dedicação ao trabalho mais salutares, que considerem a condição e as limitações da(o) profissional que executa sua atividade especializada”, afirma Luiz Francisco Júnior.

Prevenção

Considerando que as condições de trabalho podem ser as responsáveis pelos sintomas do Burnout em maior proporção do que as características isoladas das(os) profissionais ou de seu ambiente de trabalho, recomenda-se uma permanente reavaliação dessas condições em que a(o) profissional executa suas atividades. Isso visa evitar a sobrecarga e o excesso de tarefas que não tenham um significado que vá além do retorno financeiro. Também é preciso observar o reaparecimento, ainda que de forma leve, da sintomatologia que desencadeou o processo da primeira vez. Essa percepção pode ser um excelente recurso, em princípio, para que intervenções sejam realizadas, evitando quadros mais graves de adoecimento.

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