Como o Metaverso pode influenciar a Odontologia
Em outubro de 2021, o Facebook agitou o mundo mudando seu nome para Meta, instigando a humanidade a olhar para o conceito de metaverso. A tecnologia que permite a criação de mundos virtuais que replicam a realidade por meio de dispositivos digitais, abrindo infinitas possibilidades para todas as áreas de atuação pessoal e profissional, não é uma criação da gigante empresa norte-americana, e já vem sendo estudada e desenvolvida por cientistas, tecnólogos, programadores e gênios do universo virtual há algum tempo.
O cinema e a literatura já nos apontaram esse caminho em grandes obras de ficção científica, muitas com doses excessivas de criatividade sobre o improvável, mas também indicando rotas que hoje já são possíveis.
As redes sociais compartilham cada vez mais conteúdos de especialistas vendendo cursos sobre o metaverso, indicando futuras profissões que podem surgir a partir dessa nova forma de comunicação. Há quem diga, também, que quem estiver fora desse movimento corre o risco de ficar confinado no ostracismo de um mundo obsoleto.
A revista Sorrisos Brasileiros conversou com especialistas em tecnologia e cirurgiões-dentistas já familiarizados com procedimentos digitais, para entender como, quando e se o metaverso poderá impactar a Odontologia.
Segundo o desenvolvedor de experiências para o mundo virtual, Bruno Macedo, de Fortaleza (CE), o conceito que envolve o metaverso ainda é uma incógnita. “Ninguém sabe ainda exatamente o que é o metaverso, porque ele é um conceito de ficção científica, cujo significado nem figurava nos dicionários até pouco tempo atrás”, explica.
Bruno explica que, apesar de o termo já estar sendo bastante utilizado, a maioria dos especialistas considera que estejamos testemunhando a construção do metaverso. No entanto, ainda levará um tempo para vivenciarmos essa experiência de fato. “O metaverso parte da ideia de termos mundos abertos, de forma interoperável. É uma constelação de mundos virtuais, criados por diversas pessoas ao redor do planeta, que interagem por meio de avatares completamente customizados”, descreve.
A entrada nesse universo pode ser feita por meio de óculos 3D, em cenários pré-concebidos. Os avatares que representam os usuários podem ser construídos a partir de características sugeridas de formato de rosto, corpo, cabelo e acessórios; mas também é possível fazer um escaneamento corporal e criar o seu “eu digital” com uma imagem exatamente igual a sua.
“Essa tecnologia do escaneamento já existe e funciona por fotogrametria, podendo ser feita pelo próprio celular, com aplicativos específicos. A esse avatar podem ser adicionadas animações e habilidades que a própria pessoa não tenha, como dançar, saltar, fazer acrobacias. É uma entidade virtual que transforma aquele ser humano em um super-herói; uma outra versão dele mesmo. É a ideia que foi passada no filme Matrix”, diz Bruno.
Mas, o especialista observa que há ainda muitos caminhos a serem percorridos para que a verdadeira ideia de metaverso se torne possível. “Para isso, dependeremos das tecnologias de descentralização que estão sendo desenvolvidas. Hoje, as experiências são centralizadas, e não permitem que, por exemplo, você leve um objeto de um ambiente virtual para outro, porque são construídos com códigos diferentes e incompatíveis. Não é possível ainda, por exemplo, vestir o avatar com uma roupa adquirida em uma loja virtual, e usar a mesma roupa em outro ambiente também virtual, desenvolvido por outra pessoa”.
Por enquanto, a tecnologia do metaverso encontra nos jogos virtuais o universo mais explorável. Mas, as possibilidades serão infinitas para diversas áreas, principalmente aliadas a outras tecnologias já existentes, como a Inteligência Artificial e o 5G.
Como a maioria das novidades tecnológicas, o metaverso não deve trazer apenas vantagens. Bruno Macedo chama atenção para questões que devem ser consideradas, como o impacto no comportamento social e psicológico das pessoas, como o risco de criar vícios, compulsões, e até mesmo conflitos emocionais, quando se lida, por exemplo, com a perspectiva de imortalidade dos avatares.
Legislações específicas também devem ser criadas conforme a tecnologia for se desenvolvendo, principalmente no que diz respeito ao estabelecimento de limites de privacidade, identificação de falsidade ideológica, ou que fi ram, a partir do mundo virtual, qualquer direito já instituído no mundo real.
Aplicação na Odontologia
Nesse contexto, ainda não está claro como o metaverso vai impactar a Odontologia, mas já há indícios de como essa nova realidade pode influenciar o trabalho de cirurgiões-dentistas e demais especialistas. “Todas as tecnologias que estiverem ligadas à rede 5G estarão no metaverso, por ser um sistema integrado. Um exemplo disso é a cirurgia robótica”, explica Bruno Macedo. Ele aponta que, para as áreas da Saúde, essa tecnologia pode ser muito interessante do ponto de vista simulatório, auxiliando em treinamentos de procedimentos cirúrgicos. A possibilidade de criar cenários, inserindo todos os elementos e detalhes de um centro cirúrgico ou consultório odontológico, já existe com a tecnologia da realidade aumentada.
Bruno explica que, conforme o metaverso for evoluindo juntamente com a inteligência artificial, será possível criar cenários de forma mais automática, com comandos de voz. Outra possibilidade é escanear um paciente e realizar previamente qualquer procedimento sobre o avatar criado. Isso possibilitaria, por exemplo, o planejamento de um procedimento a ser realizado nesse paciente, por vários profissionais que estejam geograficamente em lugares diferentes, mas que acessem e se encontrem naquele ambiente virtual.
Nesse caso, o paciente também pode viver a experiência prévia do procedimento, de forma a sentir-se mais seguro e ambientado.
O cirurgião-dentista Júlio Cravinhos, de Teresina (PI), entende que o metaverso, em um primeiro momento, possa vir a ser utilizado na área de educação em Odontologia. “Pode-se criar institutos de ensino, com os ambientes, as pessoas e os procedimentos”, exemplifica.
Em uma perspectiva mais lúdica, Cravinhos visualiza a possibilidade de utilizar a tecnologia do metaverso para replicar o ambiente do consultório, de forma que o paciente possa fazer uma visita prévia, virtualmente, familiarizar-se com as instalações, fazer agendamentos, interagindo com um avatar recepcionista, e até realizar uma anamnese, antes de iniciar o tratamento presencial.
Ele também acredita que eventos, como congressos e palestras, possam utilizar o metaverso, agregando pessoas de diversos lugares do mundo em um mesmo ambiente, e que possam interagir entre si e com os palestrantes de forma muito semelhante a real. Da mesma forma, em eventos presenciais, palestrantes de outras localidades do País ou do mundo, que tenham um impedimento de agenda, poderiam participar por meio de holografi as, conectando-se ao vivo.
“Creio que nada vai substituir o presencial, mas vejo sim como uma possibilidade de oferecer uma experiência quase real, de maneira muito interessante”, diz o especialista.
Cravinhos observa que a Odontologia já evoluiu bastante com as tecnologias digitais, mas ainda há muitas pessoas que não têm acesso a atendimentos básicos. “Seria interessante se um dia o metaverso puder ser uma ferramenta disponibilizada em instituições públicas para levar esse acesso à população economicamente menos favorecida, viabilizando atendimentos a distância”, sugere.
A cirurgiã-dentista Patrícia Almeida também acredita no potencial do metaverso como recurso tecnológico para o ensino ou para pré-avaliações dos pacientes, mas não que essa seja uma realidade a curto ou médio prazos.
Com um trabalho voltado a levar acesso a tratamentos de ponta para pessoas com menor poder aquisitivo, Patrícia instalou sua clínica em um bairro da periferia de São Paulo, onde utiliza modernos recursos digitais. Com foco em atendimento humanizado e projetos de assistência social, ela acredita muito na relação interpessoal entre o cirurgião-dentista e o paciente, e não aposta que a tecnologia possa substituir isso.
“Acho que o metaverso ainda está muito distante da Odontologia, no sentido de se tornar uma ferramenta prioritária para o exercício da profissão”, opina Patrícia, apontando que, mesmo as tecnologias já disponíveis, ainda não são utilizadas pela maioria dos profissionais do País.
Vivemos a dualidade de um planeta que investe em missões espaciais, realiza projetos ousados de inteligência artificial, mas que ainda registra índices de fome, analfabetismo, violência e falta de acesso a tratamentos de saúde com qualidade. Assim, conciliar o mundo virtual e o real, utilizando positivamente o que os avanços tecnológicos nos apresentam, é o grande desafio que o ser humano enfrentará em um futuro próximo.
FONTE:
CFO
25/11/2022